sábado, 2 de junho de 2012
Fala tecida - Ericson Pires
(Na minha “preguiça” com as palavras, me aproximei e de certo modo estou conhecendo o trabalho deste poeta que infelizmente não está mais entre nós fisicamente. Primeiro poema que pode ler dele fiquei fascinado com tamanha delicadeza.)
Tecer-se
Catar em cada parte o fio que se perde
Tecer-se
Trair cada fim que se pretende
Tecer-se
Criar cada outro que cria outros
Não há equidistância possível entre o dito e o imaginado
Nenhuma palavra resume em si o sentido que lhe cabe
A fatalidade inesperada do som abrevia a fala novamente falada
Tecer-se
Em cada linha que cruza
Em cada ponto que surge
Em cada salto que escapa
Esquecer o silêncio
Esquecer todos os silêncio que nos calam. Esquecer que os
silêncios nos calam.
Esquecer que somos calados. Esquecer que estamos calados.
Esquecer silêncio.
Todo imenso som do silêncio. Todo o silêncio que brota
da fala. Todo o silêncio que fala alto na fala. Todo silêncio
estagnado em todo som,
em todo silêncio.
Esquecer que meu cio é silêncio, que morro no silêncio, que
só vivo em silêncio, que falo em silêncio.
Esquecer silêncio.
Tecer-se.
É preciso inventar aquilo que já existe sem nunca esperar
que aquilo termine um dia.
É preciso aventurar-se naquilo que é teu silêncio redivivo a
aventura de inventar o dia.
É preciso não descansar enquanto a fala não terminar. É
preciso não terminar a fala.
Esquivar so silêncio é perceber-se como silêncio inventado
Falar é inventar o silêncio novo
Tecer-se na fala os silêncios
no silêncio as falas
Tecer-se fio de fala som
silêncio de fala tecida.
Ericson Siqueira Pires (Rio de Janeiro, 30 de maio de 1971 - Rio de Janeiro, 19 de março de 2012). Poeta, performer, professor universitário. Foi fundador do Grupo Hapax, também foi editor da Revista Global Brasil e militante da Rede Universidade Nômade. Doutor em Estudos de Literatura pela Puc-Rio, foi Professor Adjunto do Instituto de Artes da UERJ e participa do PACC (Programa Avançado de Cultura Contemporânea) da ECO-UFRJ. Publicou Cinema Garganta, em 2002; Cidade Ocupada, 2007 e Pele Tecido em 2010.
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